terça-feira, 3 de julho de 2012

QUESTÕES À BIDI (I) - 29-06-2012


Rendo Graças ao autor desta imagem




QUESTÕES À BIDI
29/06/2012
(I)


Pergunta: Eu estou ao serviço dos meus pais embora o pedido não venha deles. Isso não me traz nenhuma alegria. Antes, eu exprimia a minha criatividade na dança, no canto, nas atividades manuais, mas agora nada. Que se passa em mim para que eu aja assim?

Ora bem, tu te colocas a ti mesma na situação de que te queixas. Portanto, a resposta está, evidentemente, em ti, e unicamente em ti, já que este constrangimento te é imposto por ti mesma e, como tu dizes, por nenhum elemento exterior.

O âmbito do que eu tenho para dizer não se coloca numa análise da tua esfera psíquica porque esta esfera psíquica não concerne senão à tua vida efêmera e não corresponde de modo nenhum ao Absoluto.

A questão que tu me colocas é, portanto, de encontrar uma maneira ou uma explicação para qualquer coisa que, de qualquer modo, é efêmera. Não pode existir resposta porque toda a resposta (mesmo a mais adequada, mesmo a mais justa, mesmo a mais eficaz) não fará senão manter-te num outro efêmero.

E enquanto tu projetas a tua vida no seio do efêmero, no seio de uma satisfação (mesmo na criatividade), tu permanecerás limitada e tu permanecerás submetida à alternância do efêmero, ou seja, aos momentos de passagem da alegria para a não-alegria. Isto é próprio de tudo o que é efêmero.

A única maneira de estar estável, a única maneira de não estares condicionada pelas tuas ações e pelas tuas reações (felizes ou infelizes) é compreender que tu não és esse saco de comida, que tu és ainda menos esse saco de pensamentos, que tu és ainda menos essa vida que tu vives.

Enquanto procurares uma resposta para isso, tu te colocas automaticamente, a ti mesma, segundo o princípio da ação/reação, ou se preferires, do bem e do mal, do que te faz bem ou do que te faz mal.

Qualquer que seja o bem que encontres, o efêmero não trará nunca uma satisfação permanente. O próprio efêmero estará sempre a fazer-te oscilar de um extremo ao outro. E o ser humano passa a sua vida, no seio do efêmero, vagueando de dores em alegrias, à procura da alegria.

O objetivo das nossas conversas não é obter um bem-estar, nem um mal-estar, mas te mostrar a situação tal como tu a vives, tal como tu a aceitaste e tal como tu a identificaste.

Enquanto estiveres identificada com tudo o que me disseste (criatividade, assistência, bem-estar ou mal-estar), tu não podes sair daí, porque, tanto num caso como no outro, tu manténs uma dependência, tu manténs um confinamento e uma incapacidade de sair daí.
Assim é a caraterística de todo o ser humano, confrontado com esta vida, com este efêmero, com esta ação/reação. Vocês passam o vosso tempo a procurar melhorar o vosso ordinário (normal).

Vocês procuram, permanentemente, obedecer às contingências sociais, morais, afetivas ou de criatividade ou de facilidade material ou espiritual. Mas nenhuma facilidade material, nenhuma facilidade espiritual, te permitirá sair deste ciclo vicioso.

A única forma de proceder é apreendendo que tu não és nem esse corpo, nem esses pensamentos, nem essa vida.

Enquanto estiveres identificada com o que me descreveste, tu andarás à volta. Não existe nenhum meio, nenhuma ferramenta, nenhuma técnica para te trazer a durabilidade e, ainda menos, o Absoluto e o Eterno.

É preciso, a ti também, distanciares-te. Distanciar-se não quer dizer capitular ou abandonar uma obrigação mas mudar a localização da tua própria Consciência porque, qual é este «eu» que tem necessidade de criatividade, qual é este «eu» que tem necessidade de sair de uma situação onde ele próprio se colocou, senão o ego?

O ego passa o seu tempo, no seio do efêmero, a ir do bem para o mal, da ação para a reação, a procurar, no seio do local em que ele se fechou, uma justificação e uma solução. Nenhuma justificação, nenhuma solução, te servirá de qualquer ajuda, enquanto tu mesma não te colocares fora daquele que crê agir, daquele que crê ser, daquele que crê ter de exprimir uma satisfação, uma criatividade, ou qualquer outra coisa, porque tudo isso pertence a qualquer coisa que é, por essência e por natureza, efêmera.

Ora, a tua essência e a tua natureza estão no oposto daquilo a que tu te submetes. É, portanto, uma mudança radical de ponto de vista: é a única solução.

Enquanto tu encontrares, mesmo no seio do efêmero, uma fonte de satisfação, uma fonte de insatisfação, tu lutarás, permanentemente, tu te esgotarás. Porque nada disso pode ser estável, nada disso pode ser Eterno e ainda menos Absoluto.

Enquanto o ser humano se encerra nas suas Ilusões (e este mundo é uma ilusão), enquanto tu creres que há qualquer coisa a resolver no próprio seio dessa pessoa, tu não deixas esse saco de comida viver a sua vida, tu não deixas esse saco de pensamentos viver a sua vida. Tu não és isso.

É preciso adotar uma mudança radical de ponto de vista. Isso chama-se a refutação e eu te reenvio para tudo o que eu disse.

A questão que tu colocas está totalmente fora de sujeito e não pode, em nenhum caso, te trazer uma solução, na minha resposta. Porque toda a solução que corresponde à tua interrogação e à pergunta não faria senão te reenviar, ainda mais, para o efêmero.

És tu mesma que te instalas no efêmero de sofrimento e de alegria. Qualquer que seja este efêmero tu sabes pertinentemente que uma alegria não pode durar, da mesma forma que uma tristeza não pode durar. Porque, mesmo a tristeza ou a alegria mais longa, se encontram confrontadas com a barreira do fim desse saco de comida e de pensamentos.

Enquanto tu agires assim, enquanto tu reagires assim, tu não podes encontrar a paz. E é normal.

A questão que tu colocas concerne unicamente à tua pessoa e à tua personalidade e, em nenhum caso, ao Absoluto. Não há alternativa ao Absoluto.

Se tu quiseres estar em paz, para além do efêmero, é preciso ver muito maior, sair dos meandros das ações/reações da tua vida, de toda a busca que apela a uma solução para uma problemática.

Enquanto tu não adotares isso, tu és prisioneira de ti mesma, na tua ilusão, no teu efêmero. Portanto, eu não posso senão incentivar-te a ir além da busca da solução referente a esse efêmero.

Enquanto tu passares a tua vida à procura de uma melhoria, enquanto tu passares a tua vida à procura de uma facilidade, qualquer que ela seja, um bem-estar, tu não podes Ser. Enquanto existir um mal-estar, tu sabes muito bem que tu não podes Ser. Mas é exatamente o mesmo para o bem-estar. Porque tanto bem-estar como mal-estar, não se exprimem senão no seio do efêmero, naquilo que se mexe, no que não é imutável e eterno.

E enquanto tu refletires assim, tu te submetes, a ti mesma, ao funcionamento do efêmero, quer dizer, a esse saco.

Tu queres permanecer um saco, enquanto a natureza e a tua essência é absoluta e é bem mais ampla do que o que tu crês, do que o que tu vives, do que o que tu experimentas?
É preciso ultrapassar esta dualidade.

Nenhuma solução trazida à tua problemática te permitirá ser completa, porque tu permanecerás incompleta enquanto te colocares, a ti mesma, na incompletude. Se tu apreenderes isso, se tu aderires a isso, sem fugir do que quer que seja, então, tudo te aparecerá claramente. Mas enquanto tu não estiveres neste ponto de vista, tu permanecerás perturbada e na perturbação.

Não existe nenhuma solução no seio do efêmero, da experiência da tua vida (como de toda a vida).

O ego vai se satisfazer ao dizer que ele paga um carma. Mas o carma não existe, salvo para a pessoa, mas não para o que tu És. E tu não És uma pessoa. Tu não És mesmo um indivíduo. Sai desse jogo.

Ir além não é somente ultrapassar uma situação, ainda menos aí trazer uma solução: é ver claramente as coisas.


Enquanto estiveres identificada com o que quer que seja do que tu vives (desse corpo, desses pensamentos) nenhuma solução pode ser durável e eficaz. Não são senão curativos que te fazem andar à roda, como toda a vida que não aceita fazer a experiência do Eu Sou.

Mas quem diz Eu? Quem diz Sou? Enquanto houver uma apropriação, no seio do efêmero, tu não encontrarás jamais a Paz definitiva. Cabe a ti saber o que tu queres.

Responder a um problema é fazer face, de novo, a um outro problema, na mesma esfera ou numa outra esfera. Assim vai a vida do ser humano que se encerra a si mesmo, cada vez mais, nesta sequência, sem fim de ações/reações efêmeras.

Enquanto tu te creres efêmera, tu estás sujeita às leis do efêmero onde está inscrito o sofrimento. E tu aderes ao sofrimento, da mesma forma que tu aderes à alegria.

Qual é o teu objetivo? Que queres tu? Se é encontrar uma solução para um problema, não é preciso dirigires-te a mim.


A única solução que eu posso dar é de te dizer que tu não És o que tu crês. Tu não És o que tu vives, o que quer que vivas, o que quer que tenhas vivido.

O que foi vivido, o que é vivido, não se refere ao que tu És. É a ilusão que te faz crer isso, o ponto de vista, se preferires. Enquanto tu não saíres desse ponto de vista, ninguém pode absolutamente nada por ti. Tu és vítima das crenças. Tu és vítima da tua própria vida, das tuas Ilusões e isso não tem fim, no seio do efêmero. Só a morte põe fim a isso (a morte desse saco).

Vai bem para além de tudo isso, sem negar no entanto o que tu vives de difícil, mas tu não és o que tu vives: toda a problemática está aí e em nenhum lugar mais.


Pergunta: Eu desejo aplicar três conselhos: permanecer tranquila, mudar de ponto de vista, refutar o conhecido. Quais são os bloqueios que me impedem de realizar isso?

Mas porque tu consideras que isso é para realizar. Não há nada a realizar.
O único obstáculo és tu mesma, no funcionamento do efêmero no seio do mental e dos pensamentos.


Enquanto tu estiveres na tua pessoa, enquanto tu te identificares (aí também), tudo o que tu reclamas não pode aparecer, porque já está aí e já está Realizado.

Enquanto tu acreditares que há um caminho, uma etapa, um tempo necessário, provas ou passos para subir, tu te afastas cada vez mais do que tu procuras, porque não há nada a procurar. Há só que Ser isso, porque tu És isso.

É sempre a pessoa, o mental ou o corpo que te vai desviar disso. Isso não é qualquer coisa a procurar, não é um esforço necessário. Isso já está aí. Isso sempre esteve aí. Foste tu que saíste.

O Amor está em todo o lado.
Tu não podes procurar aquilo que tu És porque tu És Amor.

Portanto, o que propões (permanecer tranquila, encontrar a Paz), já está aí. Tu Estás tranquila. Tu És a Paz. Mudar de ponto de vista, é aceitar isso.

Enquanto existir a mínima lacuna na crença em ti mesmo, tu não podes ultrapassar o efêmero. O Absoluto já está aí, ele não tem que ser procurado e ainda menos encontrado.

É como se tu me dissesses: «eu quero encontrar o ar». Mas tu estás no ar. Tu compreendes isto? Tu não podes procurar o que tu És e ainda menos encontrar o que tu És.

Não há senão a refutação de tudo o que é conhecido, tudo o que se refere a ti, que te pode conduzir. Mas esse resultado não está inscrito num tempo distante ou num espaço separado do que tu És, nem para além disso, nem numa crença qualquer, nem numa religião, nem numa técnica, nem num exercício.

Passa, em primeiro lugar, pelo estágio do observador. Quando tu respondes: «Eu Sou», quem observa? Quem olha? Quem está por trás do que se joga? Tu ainda estás em vias de representar a cena de teatro. É preciso, portanto, se colocar, agora, na poltrona que observa a cena e não representar a cena e depois, aí também, sair do teatro.

Isso não parará a cena (ela continuará a desenrolar-se, esse corpo continuará a viver) mas tu não serás mais afetada, nem indisposta, nem alterada pelo que quer que seja que se desenrole na cena porque tu não olharás mais para a cena. Tu não estarás mais sentada a olhar o espetáculo, tu sairás do teatro e tu constatarás, então, por ti mesma, que nunca houve teatro.

Só o lugar onde tu te colocas determina as condições às quais tu aderes (as leis físicas) mas, em caso algum, a física pode seguir a metafísica. Não há que fazer esforço porque, enquanto tu considerares que há um esforço, tu te colocas, aí também, no interior do teatro, na cena, tu representas a cena e tu aderes a qualquer coisa, mas a cena de teatro pára sempre um dia.

O teatro desaparecerá, de qualquer modo, a partir do instante em que esse saco de comida não estiver mais aí. É o jogo do mental, o jogo do ego (da própria pessoa), ao qual tu aderes, que te impede de ver claramente.
É como se aí existissem viseiras que te mostram unicamente o que está á tua frente e que te impedem, portanto, de sair do que está à frente, não só para ver o que está nos lados e atrás mas antes para apreender que não há nada a ver.

O Ser está para além do ver. O Absoluto não é um ver. Ele É o que tu És, em Essência, em Eternidade, quaisquer que sejam as circunstâncias vividas por esse corpo.

Como eu o disse: tu não és nem a cena de teatro, nem o ator, nem o espectador, nem o teatro. Enquanto tu não tiveres respondido a esta questão, enquanto tu não tiveres tido o ponto de vista exato disso, bem, o que tu procuras não pode ser obtido.

O ponto de vista onde tu te colocas é o da pessoa, esse da tua vida, mas, para ti como para cada um, enquanto tu te definires em relação à tua vida, isso só se refere à pessoa, ao efêmero, mas não o que tu És.

Enquanto vocês crerem que há algo a subir, enquanto vocês crerem que há uma progressão, enquanto vocês crerem que há uma procura que é sem fim, vocês se enganam a si mesmos: tudo já está aí. É o vosso ponto de vista que colocou a distância para a Verdade.

A Verdade não conhece nenhuma distância, nenhum tempo, nenhum espaço. Quando eu digo: «mudem o ponto de vista», isso não se refere, certamente, somente à visão. Mas, bem para além da perspectiva, é a própria Consciência que deve desmascarar o jogo da ilusão.

E, se eu posso exprimir-me assim, a montante desta consciência o que é que há? Há o que eu chamo a-consciência. Enquanto tu não estiveres dissolvida, enquanto tu não te matares a ti mesma, às tuas próprias ilusões, tu podes continuar a procurar, por muito tempo, a Paz.
Quando nós dizemos para permanecer tranquilo, é um compromisso para vos fazer mudar de ponto de vista.

Enquanto tu estiveres identificada com os teus pequenos eu, com as tuas pequenas necessidades, com as tuas pequenas satisfações ou as tuas grandes satisfações, tu não podes encontrar a Paz, tu não podes estar tranquila.

É por isso que eu disse (e que eu repito): vocês não têm outra alternativa senão a refutação do conhecido porque o Desconhecido não pode ser conhecido já que ele é o que vocês São.

O ponto de vista deve se instalar, o mesmo é dizer, sair do teatro. Enquanto tu não fizeres a experiência disto, tu estás persuadida de ser esse corpo.

Olha (por exemplo) os teus Irmãos e Irmãs, os nossos Irmãos e Irmãs que vivem a experiência de sair do corpo ou a experiência da morte, eles sabem que eles não são esse corpo, mesmo se eles regressam a ele. Pelo contrário, eles sabem pertinentemente que é um saco de comida que morre, mesmo se isso for chamado a vida.

O mundo não existe. Tudo o que é visto não pode existir, é uma Ilusão. Enquanto tu não aceitares este ponto de vista, não há solução, porque esta solução, mesmo que possivelmente existente, não se inscreverá senão no âmbito da ação/reação, no efêmero mesmo da Ilusão.


Pergunta: Numa entrevista anterior você me disse: «deixa esse corpo tranquilo, ele não tem necessidade de ti para viver», o que tenho para ouvir hoje?

Tu deixaste esse corpo viver? Vocês estão, permanentemente, em resistência. Essas resistências se exprimem pelos sofrimentos, no saco de comida ou no saco dos pensamentos.
Enquanto houver sofrimento, qualquer que seja, vocês estão no interior dessa ilusão.


Aquele que deixa o seu corpo viver (qualquer que seja a realização desse corpo, ou qualquer que seja a Paz desse corpo) não está de modo nenhum preocupado já que, tu o admitirás, tu não És esse corpo.

Quando tu morres ou quando tu dormes, o que resta de ti? Para além do sonho ou do pesadelo, onde estás tu, nesse momento? O que se torna o mundo? Ele existe ou não? O que se tornam os teus próximos, a tua família, os teus filhos, o teu trabalho? Eles estão presentes na tua Consciência quando tu dormes? Toda a problemática está aí.

Deixar esse corpo tranquilo, não quer dizer o negligenciar ou o abandonar mas não mais resistir porque, a partir do instante em que vocês não resistirem mais, em que vocês não se opuserem mais, a ação/reação não pode mais participar: o ponto de vista muda, a Paz se instala, a tranquilidade está aí. Então, nesse instante, tu descobres outra coisa além do Eu Sou, tu descobres que tu És Absoluto e que essa forma, essa vida se vive mas não te diz respeito.

Então, certamente, o ego vai se amparar no que eu disse (se tu o compreendes a esse nível) para dizer: «ah mas, eu tenho as obrigações». Mas as obrigações, elas se preenchem em si mesmas. Eu não falo das obrigações, quaisquer que elas sejam, mas da tua Consciência: onde está ela? E para além da Consciência, há qualquer coisa, para além do observador, que esteve sempre aí, que nunca mexeu, que sempre esteve tranquila, que sempre esteve em Paz.

É esse ponto de vista, em que é preciso Ser. Enquanto isso não acontecer, o efêmero prossegue o seu caminho, alterando ou melhorando a tua vida e te fazendo crer que tu estás submetido a isso, de uma forma ou de outra.

Então, certamente, o ego vai crer que vai ser preciso procurar um conhecimento espiritual, psicológico, um conhecimento do amanhã. Enquanto tu estiveres nisso, tu não estás aqui e agora, tu estás na projeção e a projeção mantém a ilusão.

Nenhuma satisfação pode ser durável, na projeção, porque mesmo que tu tivesses todas as facilidades (materiais e espirituais), mesmo se tu conhecesses todos os mistérios do Universo, o que é que isso mudaria? Absolutamente nada, senão a satisfação do ego de crer que ele vai controlar o futuro, a sua situação familiar, social, financeira, afetiva.

Enquanto tu representares a cena de teatro, tu não podes ter o ponto de vista daquele que já É Absoluto e para quem o teatro não tem mais necessidade dele. É o jogo das interações nos corpos ilusórios (mesmo sutis) que o mantém, a ele próprio, na Ilusão.

Quando nós vos dizemos que não há nada a fazer, que não há caminho, que não há evolução, certamente que para o ego há, e isso será sempre uma involução porque é sem fim no seio do efêmero. Mas este sem fim do efêmero não conduz jamais ao Absoluto porque a sucessão das causas é infinita.

Alimenta esse saco, contenta-o, mas tu não és isso. Contenta-te de o observar, de o ver e, depois, desvia o teu olhar. Então, certamente, o ego vai-te fazer crer que é a morte, o ego vai-te fazer crer que é o fim. Sim, é fim dele. Mas esse não é o teu fim, pelo contrário.

A mudança de olhar, de ponto de vista, é uma Consciência mais vasta e, mesmo essa Consciência mais vasta é efêmera porque senão (se isso fosse Absoluto) tu estarias permanentemente no mesmo estado, sem flutuação, sem movimento (o que não é, certamente, jamais o caso).

Enquanto houver procura de Luz e de Amor, isso significa que tu colocas uma distância com a Luz e o Amor e é, portanto, uma projeção.

Tu crês que há qualquer coisa a procurar, a melhorar, porque te disseram, mas será que tu podes prová-lo a ti mesma? Onde está a prova? Não existe nenhuma. É uma brincadeira, uma farsa.

Aceita isso, não como uma crença mas vivendo-o, e o aumento da consciência se tornará supra-consciência e depois a-consciência. É o momento em que tu dormes. É o momento em que tu sabes que tu És e, no entanto, onde não existe nenhum corpo, nenhum pensamento, nenhuma emoção, nenhuma interação, em que tu não estás inscrita em nenhuma realidade efêmera. O Absoluto se revela, nesse momento. Mas se ele se revela, claro, isso quer dizer que ele sempre esteve aí, ele não está noutro lugar, ele não está no amanhã.
É preciso sair do teatro, mas quem é que deve sair do teatro? Não esse corpo, não essa vida, mas o que tu És.

Tu És Amor, mas enquanto tu considerares que esse Amor está no exterior, tu fazes uma projeção, um desejo, e tu colocas uma distância, e tu crês que amanhã será melhor e permaneces presa pelo tempo, pelo espaço, pela localização no seio de um corpo.

Enquanto tu estiveres localizada, tu estás presa. Enquanto tu creres que há procura, tu estás presa. Enquanto tu estiveres ávida de conhecimento [connaissance], tu estás presa porque na realidade, tu conheces o que tu És, já que o próprio sentido desta palavra é nascer com (além disso tu não podes nascer sem. Reflete).

A essência do teu Ser, a Essência do que tu És, é Amor, é Absoluto. Descobrir o Todo, se tu preferires, é não mais ser nada, aqui, não como uma negação da vida mas antes como uma mudança de ponto de vista: isso se chama também Humildade e Simplicidade.
É apreender e ver que tu não és nada deste mundo, que tu não és deste mundo, que tu não estás sobre este mundo.

Não há mundo. Não há pessoas. Não há senão crenças, senão projeções, senão ilusões que se mantêm e se entretêm a si mesmas, no quadro do efêmero, no seio da ação/reação, do bem e do mal.

O que tu És, não pode nem nascer, nem morrer. O que tu És não pode ser afetado pelo que quer que seja deste mundo.
O que é afetado é o efêmero e, enquanto tu te identificares com o efêmero, tu és afetada e, portanto, tu sofres, de uma maneira ou de outra.

Não é questão de pôr um curativo ou um analgésico aí, onde tu sofres, é preciso mudar de ponto de vista, que te vai mostrar que, quando o Absoluto se revela, o sofrimento não existe. É esse saco de comida, é a química desse corpo, que criam o sofrimento, é este mundo.

Quando tu dormes, será que tu sofres, mesmo de uma doença, mesmo de um problema afetivo, mesmo o mais violento, como quando tu estás acordado?

O enigma está aí: o que é que tu És quando dormes? O que é que tu És quando tu morres? O que é que tu Foste antes de nascer? E eu não falo em termos de futuro ou de passado, mas antes da essência do que tu És.


Pergunta: Os ensinamentos nos convidam a nos libertarmos do conhecido, a viver o instante presente, tal como ele é e não como nós queríamos que fosse. Isso é suficiente para se tornar o amor da Luz Eterno nesta vida?

Se tu fosses capaz de mudar o ponto de vista (de não mais ser esse corpo, de não mais ser este instante que se desenrola, essa sequência lógica de acontecimentos), seria isso que tu poderias denominar um bilionésimo de segundo, certamente que isso seria suficiente.

Todo o problema está ligado à localização da Consciência, levada sobre esse corpo, sobre esses pensamentos, sobre essa vida que tu vives mas, como eu o disse, tu não és essa vida que tu vives, de forma nenhuma.

A vida está aí, independentemente de ti, independentemente do mundo. Viver isso, é ser Absoluto, não é mais uma crença, é a ausência de localização, é a ausência de identificação, é não mais jogar o jogo da ação/reação mas fazer tudo (absolutamente tudo) o que a vida propõe com a mesma equanimidade, a mesma Simplicidade e a mesma Humildade porque, no seio do Absoluto que tu És, o Absoluto não pode ser afetado, nem pela doença, nem pela perda, nem pela falta, nem pela plenitude, uma vez que o Absoluto é Infinito Eterno. O que não é esse corpo, o que não é essa pessoa, o que não são as tuas relações, o que não são os teus filhos, nem os teus pais, nem isso ao que tu estás apegado.

Isso a que tu estás apegado, te perde e te perderá. Enquanto houver um apego, há uma localização a esse corpo, a esse marido, a essa mulher, a essa criança, a essa casa. Enquanto não fores livre, como queres tu reivindicar a Liberdade?
Como crês tu poder ser livre estando apegado ao que quer que seja?

O que é a Liberdade? Enquanto tu estás no saco de comida, tu estás Livre? Sabes quem tu És? Quem Eras tu antes de nascer? Enquanto tu não tiveres essa resposta, isso não serve de nada.

Todas as outras respostas são caducas e tu voltas, e nós voltamos todos, enquanto o Absoluto não é revelado. Enquanto nós aderirmos ao conhecido (de uma maneira como de outra), nós estamos presos, aprisionados e aprisionando os outros nas nossas certezas, nos nossos apegos, nos nossos desejos, nas nossas incompletudes, porque tudo isso é efêmero e não dura senão o tempo desse saco de comida.

O que é importante é o que está dentro (o que tu És) mas tu não És o Templo, tu És o que está dentro do Templo. O Sagrado não é o corpo, mesmo se o corpo for sagrado. O Sagrado é o que é invisível, o Sagrado é o que é Eterno e Absoluto.

Não há o que fazer do tempo que passa, não há o que fazer da vida e da morte, não há o que fazer dos teus prazeres, não há o que fazer daquilo que tu crês possuir, porque no seio deste mundo, tudo o que tu possuis (sem nenhuma exceção) te possuirá.

Enquanto tu não te deres, na totalidade, o Absoluto não pode ser a tua Verdade porque, nesse momento, tu estás preso por ti mesmo.

Não procures, no exterior, um culpado ou uma causa porque, enquanto tu jogares isso, tu não és aquilo que tu És e tu crês aproximar-te mas tu não te aproximarás jamais.

Nenhum elemento deste mundo, nenhuma pessoa deste mundo, nenhuma localização no seio deste mundo, nenhum Amor deste mundo, pode te levar ao que tu És porque tudo o que foi visto, projetado, toda a possessão, é uma ilusão.

Então não peças a Liberdade, se tu não és livre. Vocês jogam um jogo que não existe em nenhum lugar senão na projeção.

Aquele que sai do seu corpo, sabe que ele não é esse corpo. Aquele que sai dos seus pensamentos, sabe que ele não é os seus pensamentos e aquele que sai da sua Consciência, sabe que ele não é a Consciência.
Isto não são crenças uma vez que vocês o podem viver.

Não há nenhum obstáculo deste mundo, não há nenhum carma. As únicas restrições são as vossas próprias crenças, nada mais.

Mais do que nunca, é preciso estar lúcido. Esta lucidez é um ponto de vista que não tem nada a ver com o ponto de vista daquele que está localizado num corpo, numa vida, numa profissão.

O Amor é Livre, o Amor é Absoluto porque é o que vocês São. Mas não o amor humano projetado numa afeição, qualquer que ela seja,
porque todas as vossas afeições não fazem senão traduzir os vossos próprios vazios e as vossas próprias incompetências em ser Absoluto porque não há nada a preencher, salvo para o efêmero.

A essência é Amor: o que vocês São, o que nós Somos todos. Se nós somos isso, então não há nada a procurar, não há ideal, não há nada a idealizar, não há nada a crer. É preciso, bem por contrário, descrerem, aceitar nada ser, aqui, na consciência que vocês vivem e, instantaneamente, vocês São o Todo, Absoluto.

Se a mínima parcela de efêmero permanecer (nos vosso apegos, nas vossas possessões, na necessidade de constranger o mundo, de se oporem, de agirem ou de reagirem) vocês se inscrevem, a vocês mesmos, no sofrimento, no efêmero e na falta.

Ora, vocês São a plenitude do Amor. Vocês São Absoluto. Os limites e as barreiras não vêm senão das vossas projeções, sejam elas as mais felizes.

Enquanto vocês projetarem, vocês não podem ser Absoluto. Enquanto vocês procurarem, vocês não podem encontrar. Tudo o que vocês creem encontrar não faz senão vos afastar, porque o que vocês encontram vos inscreve numa localização sobre este mundo, neste mundo, e tudo isso é efêmero.

O mundo desaparece enquanto vocês dormem. Dêem-se conta; vocês correm atrás das quimeras, vocês procuram uma satisfação imediata ou programada, vocês se atribuem papéis, profissões, funções. Mas vocês não são nada de tudo isso. Vocês São Absoluto, Amor.


Pergunta: Desde há algum tempo, em qualquer circunstância que, antigamente, gerava emoções de todo o gênero, a ausência de emoção me deixa um pouco perplexo. Este é um pequeno passo para o Absoluto que eu devo ser?

Não há um passo a passo para o Absoluto. Todas as vezes que as emoções secam, num primeiro tempo, isso pode te levar a pensar que há um desinteresse ou qualquer coisa de bizarro ou de não habitual. Isso é efetivamente um passo para o Si que, efetivamente, pode parecer te aproximar do Absoluto, que já está aí.

O desinvestimento da localização desse saco de comida, como dos sacos de pensamentos, efetivamente, se traduz pela rarefação e o desaparecimento das emoções, porque a emoção é o que põe em movimento.

Ora, o Absoluto não é o movimento: ele é a ausência de movimento como não participação neste mundo em movimento. O efêmero é movimento. O Absoluto é não movimento, porque o que é o Todo não pode estar em movimento. As partes do Todo podem estar em movimento.

Assim, portanto, quando as emoções secam, mesmo que isso possa parecer bizarro, está muito bem. Porque isso é a prova indiscutível de que tu não participas mais nos movimentos do efêmero.

Mais uma vez, isso não é um desinteresse ou um descomprometimento mas, antes mais um ponto de vista que muda. É um grande passo do ponto de vista. O ponto de vista se alarga, tu não estás mais na cena de teatro, tu és ainda aquele que pode observar mas que não vive o que se vive na cena. Então, isso não é habitual.

Isso se pode traduzir, num primeiro tempo, como um sentimento de estranheza, mas é normal. Isso traduz o processo de desligamento da ilusão do efêmero, do conjunto dos sacos do efêmero.
A partir desse instante, o observador se revela, o que te dá a apreender que tu estás sempre aí, apesar de não haver mais emoção.

Quem é que está aí? Quem é que olha? Quem é que observa, senão o que tu És, na Verdade, no Absoluto? Isso não é, portanto, um passo para o Absoluto mas, bem mais, um passo do ponto de vista. Em lugar de estar no pé da montanha e de ter uma visão limitada pelas árvores, tu te afastas da montanha e tu vês a altura e o topo da montanha. É uma etapa. Resta agora apreender que não há etapas.
Lembrem-se das cascas de cebola: as verdades são camadas empilhadas. A verdade da primeira camada não conhece nada das camadas que estão por cima. Mas a camada mais extrema contém todas as outras camadas, mesmo se ela não as vê, mesmo se ela não as sente.

Assim evolui a Consciência no seio da Supra Consciência denominada Turiya. E vem, depois, o equivalente do sono, quer dizer, a não consciência (bem para além do Samadhi) que dá a viver o Absoluto. Do ponto de vista limitado é um passo, mas do ponto de vista do Absoluto, isso não muda nada já que isso sempre esteve aí.

Resumindo, quanto mais vocês penetram a supra-consciência, mais vocês dormem, menos este mundo tem peso sobre vocês. E, como eu o dizia, vocês sabem todos que se vocês dormirem, qualquer que seja o problema, não existe mais. Ou então, não há sono: há pesadelo ou sonho.

Nem a emoção, nem os pensamentos, nem o saco de comida, nem o conhecimento, nem a espiritualidade têm qualquer utilidade para ser Absoluto.
São armadilhas que vos mantêm na ilusão do efêmero.

Nada do que vocês São é efêmero. Os desempenhos de papel mudam permanentemente. Vocês mudam de assunto como de canal de televisão, como de olhar, como de profissão. Mas tudo isso é efêmero porque, justamente, isso muda.

O Absoluto nunca mudou e não mudará nunca o que vocês São. Então, certamente, se vocês têm necessidade de jogar, então, joguem.

Lembrem-se: o Absoluto não é uma missão, muito menos uma etapa. É um Último. É o momento em que todo o conhecido se apaga. Não é a morte, mesmo se o ego vos diz isso, mesmo se o mental vai secretar a química do medo. Porque o saco de comida, como as emoções, como os pensamentos, têm o péssimo hábito de vos fazer crer que eles são verdadeiros. E vocês estão identificados com isso, vocês aderiram a isso, de uma maneira ou de outra.

Não é importante conhecer as maneiras que conduziram a isso, isso não tem nenhuma espécie de importância. Enquanto vocês estiverem interessados na ação/reação, a Ação da graça não pode ser a vossa Morada, porque vocês colocaram a vossa Morada nesse saco, nesses pensamentos, nessa vida.

Então, vocês vão alimentar-se de pitadas de Luz, vocês vão criar a evolução, vocês vão criar o melhoramento, a procura. Mas, são tolices. Isso não tem nenhuma existência, isso não existe em outro lugar senão nas projeções, em outro lugar senão na ilusão.

A única questão essencial é: «o que é que vocês São?». E este «vocês São» não tem nada a ver com o que vocês creem ser. O que quer que vocês vivam é efêmero. Mesmo a coisa mais perfeita desaparecerá totalmente com esse corpo.

Então, claro, vocês aderiram ao carma. Mas o carma não se refere ao que vocês São, ele se refere a um outro efêmero que não existe mais, ainda menos que o outro: as vidas passadas.

É preciso escolherem: Absoluto ou efêmero. Mas não esperem encontrar um contentamento durável no efêmero. Mesmo o Si não é estável. É fácil descrever a experiência do Si, da não separatividade, do Amor Infinito. Mas será que isso é o Absoluto? Não, seguramente.

Porque o que vocês podem exprimir, com palavras, das vossas próprias experiências, das vossas próprias memórias, desaparecerão com o desaparecimento desse saco. É isso que vocês São?

O que procuram vocês e porque o procuram vocês? O que procuram vocês para preencher, para tranquilizar, se não é o vazio desse corpo e desses pensamentos que não são senão projeções, conchas vazias. E no entanto, vocês estão dentro: portanto, vocês não podem daí sair. É simplesmente o ponto de vista que muda. A partir desse momento, tudo irá rapidamente para vocês.

O princípio da refutação do conhecido vos conduz, se o podemos dizer, a ser Absoluto. Mas, mais uma vez, refutar não é rejeitar: é ser consciente. Deixem esse corpo fazer o que ele tem que fazer, deixem esse corpo pegar nas vossas crianças, deixem esse corpo ir trabalhar. Vocês não são nada disso. Façam-no, mas não invistam nisso absolutamente nada, senão vocês alimentarão o ego, vocês alimentarão o efêmero. Vocês chamam a isso a satisfação e o bem-estar. Mas nenhuma satisfação e nenhum bem-estar são Absoluto, porque se inscrevem no efêmero.


Pergunta: A Onda da Vida começou a subir e parou. Pode-me orientar para que eu possa emergir do caos?

É preciso passar pelo caos. Enquanto tu não estiveres morta, tu não podes encontrar o que tu És.

Por que refutar o caos? Ele está aí, tu não És isso. Não faças nada, não lutes contra: olha-o. Tu és isso? Isso prova que tu estás identificada com esse caos, mas tu não És essa caos.

O caos se refere ao efêmero, quaisquer que sejam as palavras que aí coloquemos. O caos não traduz senão o caos do ego, o caos do corpo, o caos dos pensamentos. Mas agradece ao caos, observa-o e, se tu estás lucida e o vês, tu sabes bem que tu não És isso. E se tu pensas sê-lo e vivê-lo é porque tu ainda estás, em alguma parte, apegada.

Porque o ser humano crê estar apegado à sua família, aos seus filhos. Mas vocês estão tão apegados aos vossos sofrimentos, mesmo se vocês dizem (e, sobretudo, se vocês dizem): «eu não quero sofrer».

Lembra-te: tu não tens que lutar contra o caos. Não há solução para ele. Olha-o, observa-o e tu constatarás que tu não És nada disso. Nesse momento, o sofrimento deixar-se-á ir, o caos se dissolverá em si mesmo, não por uma qualquer ação, não pela aplicação de um curativo. Sê lúcida.

Tu o disseste: tu estás lucida mas ainda há, em alguma parte, uma adesão a estas projeções. Então, certamente, poderiam dizer-te que está ligado ao que tu viveste no passado, mas isso não tem nenhuma espécie de importância.

Observa, no instante. Não procures causas que possam ser verdadeiras ao nível da cebola, mas não noutro lugar, e sobretudo não no Absoluto. Olha o caos. Será que tu És isso? Definitivamente, não. É impossível. Observa lucidamente e livra-te disso, não lutando contra, não levando aí uma solução (porque tu o reforçarias). Mas simplesmente porque tu exprimiste essa lucidez, tu tens a capacidade real.

Será que o caos está aí quando tu dormes? Certamente que não. E quando tu acordas, ele está sempre aí. Onde está ele enquanto tu não estás aí? Reflete. É muito simples. Não é um enigma ou uma charada. Que tens medo de deixar, se não a tua pequena pessoa efémera?

Nenhuma perfeição eterna pode ser obtida no efêmero. Tu podes ter a ilusão, da mesma forma que tu podes transformar um rosto com maquiagem, ou tornar visível, pelas roupas: chamar a atenção e o olhar para qualquer coisa que não a Verdade, a fim de não ver o que nasceu. É o mesmo princípio: solta-te, refuta.

Nenhum caos pode atingir o que tu És, qualquer que seja o grau de sofrimento, qualquer que seja o grau de lucidez. Tudo isso não é senão uma cena de teatro. Tu tens já a oportunidade do observador, de estar lúcido, como tu dizes. Então, vai mais longe.

É suficiente não te inscrever nesse caos, é suficiente não lutar contra, mas, simplesmente e objetivamente, olhá-lo. Se tu fizeres isso, então, se eu o posso dizer, está ganho.

Todo o problema vem, em definitivo, do medo: o medo de perder o corpo, o medo de sofrer, o medo do abandono. Mas tu não podes abandonar o que tu És, de toda a Eternidade. Tu És Absoluto.

O caos é uma lixiviação do efêmero. Permanece tranquila, deixa agir, mas tu não És nada disso. Aceita-o. Vê-o. É muito simples.

Mas se a tua lucidez te leva a querer agir ou querer reagir, então tu te inscreves, a ti mesma, em qualquer coisa que vai durar no efêmero. Então, se tu fizeres a tentativa de aplicar o que eu disse, de forma extremamente rápida, a tua lucidez se tornará ainda mais clara. Tu não poderás ser alterada por esse caos que não te concerne de forma nenhuma.

Neste gênero de questão que tu colocas, aí também, há etapas, não para o Absoluto, mas etapas de lucidez que devem ser atravessadas, umas atrás das outras, não lutando, não se opondo, mas antes olhando, não somente a situação, não somente o caos, mas antes a ti mesma, para além desses sofrimentos, para além desse caos.

Então, nesse instante, haverá um instante, detectável entre todos, onde qualquer coisa bascula. Tu passas do efêmero, se o podemos dizer, ao Absoluto, mesmo que aí não haja passagem, nem basculamento, nem retorno. Mas isto, a Consciência o percebe claramente. Mas, aí também, tu não és o que se apercebe claramente disso. Aí também, é preciso ir além.

Fazer isso, observar isso, é não mais dar peso ao caos, não mais dar atenção ao efêmero, às crenças, às suposições, mas antes se aproximar da Infinita Presença. E aí, o Absoluto está paticamente aí, para ti.

A procura da perfeição, como a culpabilidade que tu exprimes, não são senão medos. Mas tu não tens que lutar contra esses medos, tens apenas que os olhar (como para o caos), de ver que isso está ligado, que isso funciona em sinergia no seio do efêmero, mas não pode, em caso nenhum, tocar ou alterar o que tu És, na Verdade.

Aceita, portanto, a tua imortalidade. Tu não és nem esse corpo, nem o que tu viveste, nem as tuas atividades. Tu és o caos e é nesse caos pessoal, individual (que é uma morte mítica e mística), que o Absoluto está. Esse momento de terror que te faz crer no fim, não é, de fato, senão a abertura ao Verdadeiro, quer dizer, ao Absoluto. Certamente o corpo, certamente os pensamentos, vão fazer de tudo para evitar que penses assim.


Pergunta: Estarei eu pronta para aceitar o ponto de basculamento para o Absoluto?

A tua pergunta não quer dizer grande coisa. Quem coloca a questão? Se não é a vidência, ainda menos será uma autoridade exterior que te vai dizer: «está bem» ou «não está bem».Não há que estar pronto para qualquer coisa que sempre esteve aí. Tu não tens um traje para te casares. É preciso aceitar estar despojado, totalmente nu, no caos, no Abandono o mais total.

Sou mais eu que te pergunto: “estás pronta?” Porque só tu tens a resposta. Como podes tu projetar uma resposta vinda do exterior? O que te faz pensar ou crer nisso, senão as tuas próprias indecisões, as tuas próprias dúvidas? Toda a resposta está em ti.

Não há melhor momento que o instante presente. Não há distância, não há procura, não há roupas a usar, não há que estar pronto. É a perspectiva do ponto de vista da personalidade que te vai fazer crer que é preciso estar pronto ou não pronto.

Ter-se pronto, ou não se ter pronto: mas isso não quer dizer nada. Aliás, não há nada a dizer. O que procuras tu dizer a ti mesma? Que queres tu ocultar? Sobretudo nada crer.

Não há que estar pronto ou não estar pronto para qualquer coisa que sempre esteve aí. É o ponto de vista da personalidade que, sempre, através das palavras que tu empregas, mostra mesmo que tu esperas qualquer coisa ou que tu esperas e temes qualquer coisa. Mas é o mesmo princípio: esperar, temer, ou outro, não são senão a projeção das tuas próprias incertezas Interiores.

E de que Interiores falas tu? E de que interior eu falo? O do si. É preciso Abandonar o Si para ser Absoluto, porque o Absoluto já está aí, ele engloba o Si, ele é o Não Si, o Não Eu, o Não Ser, o Não Parecer. Ele é o Para Brahman, quer dizer, o Todo para além do Todo, o Absoluto Último, Amor.

Como poderás tu estar pronta para o que tu já És? A noção de preparação coloca uma distância, mesmo uma separação. Não há nada a preparar. Não há que estar pronto ou não estar pronto, porque adotar isso é reenviar-te para uma certa forma de linearidade, no efêmero, na incompletude. É uma projeção, aí também.

Não é um casamento, não tens nenhum outro a encontrar senão o que tu já és. Somente o ego crê nisso e especula hipóteses sobre isso.


Pergunta: O que é oportuno que eu ouça da vossa parte?

A primeira resposta é: “nada de nada”. A segunda resposta é: “que aguardas tu, que esperas tu ouvir?”

Nenhum conhecimento vindo do que eu te possa dizer, do que tu És, te permitirá Ser e ainda menos tornares-te. É preciso fazer Silêncio. Este Silêncio não é um constrangimento que diz: “eu paro de pensar, eu paro de mexer”. Mas é o Silêncio do observador.

Quem pensa? Quem fala? Quem vive? Quem tem esse nome que tu trazes? Se tudo isso pára, então eu posso te dizer o oportuno que é parar tudo isso.

O Absoluto, mais uma vez, não é uma etapa, nem uma palavra a dizer (quaisquer que sejam), uma vez que o Absoluto se revele, justamente, a partir do instante em que há o Abandono do Si ou o Abandono do Eu, sem sofrimento, sem querer fugir do que quer que seja. Mas antes, verdadeiramente, o momento em que o Silêncio se faz e onde nada se diz, onde nada mais é oportuno.

É o momento da Dissolução, chamado anteriormente o caos, na pergunta anterior. Viver o caos, é ousar também se Abandonar, não mais depender do Eu e do Si, tornar-se, realmente, independente e Livre, quaisquer que sejam as circunstâncias da tua vida.

Nenhuma criança, nenhuma regra social, nenhuma violação desse corpo poderá alterar isso. Definitivamente, e aí também, “permanecer tranquila” faz todo o sentido.

Como eu disse, numerosas vezes, aquele que olha a cena de teatro não se pode pôr de pé e incomodar os outros espectadores. Ele está numa poltrona, ele observa. Ele, também, está cativo. Mas o fato de estar cativo do observador conduz à não-Consciência ou a-consciência. Mas isso já está aí.

Não existe nenhuma distância, nenhum tempo, nenhum apego que possa travar ou conter o Absoluto, já que o Absoluto contém tudo isso.


Pergunta: como fazer para não intervir mais na vida corrente?

Mas justamente, não há nada a fazer e tudo se fará.

Vocês têm tendência a considerar, uns e outros, que quando vos dizem para deixar fazer, para permanecer tranquilos, vocês irão ficar sentados numa poltrona e esperar. Vocês não entenderam nada mas está muito bem porque, justamente, não há nada para compreender.

Refutar não é negar: é simplesmente o ponto de vista que muda. A ação se desenrola sempre, o fazer terá lugar, mas a Consciência não o fará. Vocês observarão o que se faz. É o ponto de vista que muda. E vocês perceberão, e vocês manterão, uma visão limitada.

Quando eu vos digo que este mundo não existe, será que isso quer dizer que tu vais sair deste mundo assim que tu fechares os olhos, ou assim que tu te coloques no sofá? Mas certamente que não. Não é preciso negar o que vive esse saco de comida: é preciso não se implicar nisso. É isso, permanecer tranquilo. Isso não quer dizer tornar-se um legume, isso quer dizer fazer e intervir, mas tu não és nem o que faz, nem o que intervém.

É um problema de posicionamento. Isto foi repetido numerosas vezes. Quando vos dizem para não fazer nada isso não quer dizer ficar sem fazer nada, sentado em algum lugar, ou na cama. Certamente que não.

Façam o que é para fazer, respondam às vossas obrigações, quer elas sejam ligeiras ou pesadas, mas vocês não são nada disso. É o ego que se ampara nisso, na tua pergunta. É o ego que se diz: “mas como posso eu parar de fazer, os meus filhos, as minhas obrigações, a minha família?». Ninguém te pediu para parar o que quer que seja. É uma mudança de ponto de vista.

Tu não és o que faz, tu não és o que intervém. É o ego que, espontaneamente, quer limitar segundo o que ele percebe, claro, e que te faz crer que isso não é possível.

Será que aquele que sai do seu corpo pára de viver? Não, ele está bem mais vivo do que quando ele age. Da mesma forma (e eu o repito), não há nada a rejeitar.

Refutar não é rejeitar: é mudar de olhar, mudar de ponto de vista. Certamente, o que eu digo é incompreensível para o ego, porque o ego não vê e ele tem razão. Como ele poderia fazer, sem fazer nada?

Se eu dei o exemplo, numerosas vezes, da cena do teatro, não foi por acaso. Eu vou retomar um outro exemplo: o da corda. Tu entras numa sala mal iluminada, os teus olhos veem uma corda, mas como está mal iluminada tu és persuadido de que é uma serpente e tu tens medo e tu acendes a luz e apercebes-te que não é senão uma corda. É exatamente o mesmo princípio. Dito de outra maneira, na vossa linguagem corrente, vocês levam balões por lanternas. Não há serpente e, no entanto, tu acreditaste nisso. Mas o fato de mudar a iluminação te fez dar conta do teu erro.

É o mesmo princípio para a vossa vida: ninguém vos pediu nunca para não intervir, para não agir. Pelo contrário, esse saco de comida deve viver o que ele tem para viver, ligeiro ou pesado. Mas não se impliquem, porque isso não são vocês. É o ponto de vista que muda, não é a ação. Mas a personalidade, claro, não vai compreender isso.

Eu expliquei que a melhor forma de aí chegar é a refutação. Refutar não quer dizer nada fazer, é manter-se tranquilo, é deixar se fazer. Este Fazer não tem necessidade do que tu És. É toda a diferença.

O ponto de vista, a clareza, o olhar: não há serpente, é uma corda, é uma crença e depois, somente depois, não há mais nem serpente nem corda. Mas não é porque tu vais dizer que não há serpente e não há corda, que isso vai ser verdade. É como as camadas de cebola, é parecido.

Será que a camada de cebola que está mais perto do centro, conhece a vida do envelope da cebola? Não. É parecido para ti. Será que o fato de ser Absoluto faz desaparecer o que quer que seja do que está no interior da cebola? Certamente que não. Mas a lógica do ego é de te fazer crer que sim. Daí esta pergunta.

O Absoluto não é aquele que permanece numa gruta. O Absoluto pode efetuar não importa o quê, no seio de uma forma, mas ele sabe que ele não é essa forma e, no entanto, ele faz. É uma mudança de ponto de vista, não de ação.

Não é passar da ação à inação, não é parar todas as interações, não é matar pai e mãe ou filho. É um outro olhar, uma consciência alargada. É passar daquele que é ator da sua vida, àquele que olha. É o observador: aí está o Eu Sou. E depois, o observador desaparece, ele também; não há mais localização no seio de um corpo, no seio de uma história.


Mas quem disse que a história devia parar?
Ninguém, senão o teu ego.




Mensagem de BIDI,
pelo site Autres Dimensions
em 29 de junho de 2012





Rendo Graças às fontes deste texto:

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